Por – Henrique Kehl Especialista em Direito Digital

Em 14 de agosto de 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) foi sancionada no Brasil. Inspirada no Regulamento Europeu de Proteção de Dados (GDPR), a norma trouxe ao país um marco regulatório capaz de equilibrar inovação tecnológica e proteção de direitos fundamentais.
Sete anos depois, a LGPD já se consolidou como pilar da cidadania digital e diferencial competitivo para empresas que entendem que confiança é um ativo valioso. Mais do que um conjunto de regras, ela representa uma mudança cultural sobre a forma como tratamos dados pessoais.
Por que a LGPD foi criada?
A entrada em vigor da LGPD marcou o início de uma nova era no tratamento de dados no Brasil. Em um cenário de transformação digital acelerada, em que a coleta e o uso massivo de informações pessoais se tornaram parte central de modelos de negócio, tornou-se urgente estabelecer limites claros e mecanismos de proteção. Sem regras, a assimetria entre quem detém os dados e quem é o titular poderia gerar abusos, violações de privacidade e perda de confiança nas relações comerciais e institucionais.
A lei, portanto, nasceu com múltiplos objetivos:
- Proteger direitos fundamentais como privacidade, liberdade e dignidade humana;
- Harmonizar o Brasil com padrões internacionais de proteção de dados;
- Garantir segurança jurídica nas relações envolvendo tratamento de dados;
- Estimular a economia digital com regras claras e confiáveis.
Ao adotar um modelo inspirado na GDPR, a LGPD reforça que dados pessoais não são simples insumos para transações comerciais, mas extensão da identidade e da história de cada indivíduo, merecendo proteção e tratamento responsável.
Impactos para pessoas e empresas
A LGPD já deixou claro que seus efeitos vão muito além das sanções previstas. Ela alterou a dinâmica entre titulares de dados e organizações, redistribuindo responsabilidades e fortalecendo o poder de escolha dos indivíduos. No dia a dia, isso significa mais transparência, mais segurança e mais equilíbrio nas relações digitais.
Para os cidadãos, a LGPD representa um avanço inédito no controle sobre informações pessoais. Agora, qualquer indivíduo pode:
- Solicitar acesso aos seus dados;
- Corrigir informações incorretas;
- Requerer exclusão de registros;
- Pedir portabilidade para outro fornecedor;
- Questionar decisões automatizadas que impactem seus direitos.
No ambiente corporativo, a lei provocou um reposicionamento estratégico. Empresas de todos os portes precisaram rever práticas e adotar novos padrões de governança, entre eles:
- Nomeação de encarregados de dados (DPOs);
- Criação de comitês de privacidade;
- Implementação de programas de governança da informação;
- Treinamento contínuo e conscientização de equipes sobre a cultura de proteção de dados.
Mais do que adequação formal, a LGPD impulsionou um movimento de mudança cultural, no qual proteger dados é proteger a própria relação de confiança entre empresa e cliente.
O papel da ANPD
A criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) foi um passo fundamental para garantir que a LGPD fosse mais do que um texto legal. Ela atua como guardiã da lei, interpretando, regulamentando e fiscalizando seu cumprimento, além de servir como ponte entre o poder público, as empresas e a sociedade. Sua presença oferece segurança jurídica e contribui para que as regras sejam aplicadas de forma uniforme em todo o país.
Muito além da função fiscalizatória, a ANPD desempenha um papel ativo na construção da cultura de proteção de dados no Brasil, por meio de ações como:
- Publicação de regulamentos e guias práticos para aplicação da lei;
- Definição de critérios para transferências internacionais de dados e aplicação de sanções;
- Promoção de ações educativas e incentivo ao diálogo com a sociedade e o setor produtivo.
Essa abordagem equilibra rigor e orientação, aproximando a LGPD da realidade prática das organizações e ajudando a transformar o compliance em um elemento estratégico para negócios sustentáveis.
Benefícios que vão além da conformidade
Embora muitas organizações tenham iniciado sua jornada na LGPD motivadas pelo temor de sanções, rapidamente ficou claro que a lei oferece muito mais do que um checklist regulatório. Incorporar a proteção de dados à estratégia de negócio é também investir em reputação, credibilidade e valor de marca.
Quando a privacidade é tratada como um princípio central, os ganhos se multiplicam:
- Aumento da confiança de clientes, parceiros e investidores;
- Redução de riscos jurídicos, financeiros e reputacionais;
- Acesso a novos mercados e oportunidades que exigem padrões elevados de conformidade;
- Estímulo à inovação responsável, com produtos e serviços mais seguros e transparentes.
Em última análise, a LGPD se revela como uma alavanca de competitividade, permitindo que as empresas construam relações sólidas e duradouras baseadas na confiança — um ativo que, no cenário digital, vale tanto quanto qualquer recurso financeiro.
Olhando para o futuro
Após sete anos de vigência, a LGPD já demonstrou que privacidade e segurança de dados não são modismos passageiros, mas fundamentos indispensáveis para qualquer sociedade digitalmente conectada. A lei não apenas estabeleceu regras, mas também pavimentou o caminho para uma mudança cultural que tende a se aprofundar nos próximos anos.
O desafio agora é ir além do cumprimento formal e incorporar a proteção de dados ao DNA organizacional. Isso significa que a conformidade deixa de ser um projeto pontual para se tornar parte da estratégia, influenciando decisões, processos e até mesmo modelos de negócio.
As empresas que internalizarem essa visão estarão mais protegidas contra sanções e incidentes, ganharão resiliência e adaptabilidade frente a novas regulamentações, conseguirão competir de forma sustentável em mercados cada vez mais exigentes e manterão a confiança como diferencial competitivo duradouro.
No futuro, não será apenas sobre cumprir a LGPD, mas sobre viver seus princípios como parte natural da forma de fazer negócios.
Conclusão
Celebrar os sete anos da LGPD é reconhecer não apenas a criação de um marco legal, mas a consolidação de uma nova mentalidade sobre o uso de dados no Brasil. Desde sua promulgação, a lei vem redefinindo padrões de transparência, segurança e responsabilidade, estimulando empresas e instituições a repensarem a forma como coletam, processam e protegem informações pessoais.
Esse movimento representa mais do que o atendimento a uma exigência normativa. Ele sinaliza a evolução para um cenário em que a proteção de dados é parte integrante da estratégia organizacional e do relacionamento com clientes, parceiros e sociedade. Ao internalizar os princípios da LGPD, as organizações constroem confiança, reduzem riscos e reforçam sua relevância em um mundo cada vez mais orientado pela informação.
Assim, o aniversário da LGPD não é apenas uma data simbólica. É um convite para reafirmarmos o compromisso com a privacidade, a ética e a inovação responsável, fortalecendo os alicerces de uma sociedade digital mais justa, segura e sustentável.
Por – Henrique Kehl Especialista em Direito Digital